Quando meu pai morreu, eu queria que ele morresse logo. Aquela agonia, aquele se desfazer aos poucos era uma facada no meu peito. Um dia cheguei na sua casa e ele tinha tirado a barba. Apareceu um rosto magro e cinza. Meu pai estava ainda muito mais triste que no dia anterior. Depois de vinte anos barbudo ele tirou a barba e encontrou outra pessoa. Fiquei com a sensação que aquele tinha sido seu último ato de esperança: quem sabe por detrás da barba ele não estivesse mais jovem, menos doente.
Depois que ele morreu, já no dia seguinte, a sensação ruim da sua ausência era tão grande que eu queria que ele voltasse mesmo magrinho, mesmo sem barba. Um misto de saudade e culpa.
Fiquei ainda um bom tempo com o ímpeto de pegar o telefone e ligar pra ele, fazer um comentário qualquer ou combinar um almoço no dia seguinte. Uma vez, numa festa, chorei copiosamente por que uma amiga abraçou seu pai.