quinta-feira, 18 de abril de 2013

Inconsciência

E quando acordou da cirurgia o médico lhe perguntou se ele lembrava o que tinha dito, ainda sob o efeito da anestesia. Não se lembrava de nada. E o médico lhe disse que toda a equipe havia sido convidada, ainda no centro cirúrgico, para assistir sua peça, que estava em cartaz até o final daquele mês.
É o teatro impregnado na alma, no inconsciente de quem vive para isso, ainda que não saiba muito bem porque. Me lembrei imediatamente de Dulcina de Moraes, atriz magnífica que dedicou toda sua vida a essa arte efêmera e infelizmente morreu sem um décimo do reconhecimento merecido.
Luiz Carlos de Moraes, ator e sobrinho de Dulcina, com quem tive a honra de trabalhar, me contou um dia na coxia essa história: Dulcina já bem velhinha, internada no hospital, fora da realidade convencional, ensaiava um texto com as enfermeiras. Ao receber a visita de um parente, o puxou para um canto do quarto interrompendo o ensaio. O texto é ótimo, o problema é que elas são péssimas atrizes! Ouvi essa história e meus olhos se encheram d'água. Compreendi imediatamente que não tenho como fugir do que está assim tão impresso em minha alma. Porque o teatro, se formos pensar racionalmente, assim na ponta do lápis, é inviável, é impossível. Mas a vida, para quem depende dessas tábuas, desse encontro e desse cheiro de poeira...ah, a vida sem o teatro para mim é impensável!